FOLHA DE S.PAULO – 14/03/2019

Fernanda Canofre

Depois de cerca de 30 horas de prisão, o jornalista venezuelano Luis Carlos Díaz, 34, foi liberado em Caracas, na noite desta terça-feira (12). Ele havia sido detido pelo Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), da ditadura de Nicolás Maduro, no fim da tarde de segunda.

Díaz responde a acusação de incitação à delinquência, terá de comparecer diante das autoridades a cada oito dias e não poderá deixar o país sem autorização, segundo o sindicato de jornalistas da Venezuela.

Em conversa com jornalistas, ele disse que está proibido de comentar o caso. “O processo continua, não posso dar declarações. Tenho mil histórias, mas não posso dizer nada. Isso dependeu de vocês. Viva o jornalismo venezuelano, todo poder às redes. Esse é o momento das redes”, afirmou.

Apresentador de programas de rádio, Díaz também é conhecido na Venezuela e fora dela por seu papel como ativista de direitos digitais. Junto à esposa e comentarista política Naky Soto, 45, ele manteve um programa primeiro no YouTube e depois na plataforma Patreon, na qual comenta a situação da Venezuela.

Foi um dos vídeos publicados pelo casal e editado por apoiadores de Maduro que levantaram acusações de que ele teria ajudado a causar, com ataques hackers, o maior apagão elétrico da história recente da Venezuela.

Desde a semana passada, quase todos os estados tiveram cortes de eletricidade, agravando ainda mais a situação de falta de alimentos e de medicamentos e a hiperinflação que vive o país.

A causa do apagão ainda não está esclarecida. Enquanto o presidente autodeclarado Juan Guaidó culpa a corrupção e a falta de manutenção no sistema elétrico, em um pronunciamento na noite de segunda-feira, Maduro defendeu que houve sabotagem organizada pelos Estados Unidos.

“Ele é acusado de ser hacker, quando na verdade trabalha pelo contrário, pelos direitos digitais. Ele forma pessoas para usar as redes, não tem especialidade em mexer com códigos. Isso é uma loucura”, afirmou Naky Soto à Folha.

No vídeo, Díaz responde a pergunta de um seguidor sobre os efeitos que apagões podem ter em um país. Em um cenário hipotético, ele fala sobre “as pessoas saírem às ruas e pressionarem até que o tecido social tenha sido recuperado”.

Detido enquanto ia de bicicleta para casa, por volta das 17h30 de segunda, Díaz foi levado ao Helicoide, um edifício em Caracas construído para ser um shopping center, mas que vem sendo usado como presídio para presos comuns e políticos pela ditadura de Maduro.

Depois de oito horas como desaparecido, com as forças de segurança negando saber seu paradeiro, Díaz apareceu algemado para acompanhar buscas do serviço de inteligência em sua casa, na madrugada de terça. Foram apreendidos computadores, celulares, pen drives e dinheiro. Neste momento, ele relatou que foi agredido durante sua detenção.

O nome da mulher de Díaz também aparecia nos documentos de prisão que foram apresentados mais tarde por agentes de segurança. Porém, eles teriam dito a Naky que, por ela estar em tratamento contra um câncer de mama, não a levariam se permanecesse quieta.

A prisão do jornalista motivou campanhas nas redes sociais, manifestações de órgãos de defesa de direitos humanos e liberdade de imprensa e da alta comissária da ONU para direitos humanos, a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet. Uma comissão do alto comissariado do órgão está na Venezuela para apurar violações de direitos humanos no país. 

Durante a audiência para pedir sua liberação, no Palácio de Justiça, Díaz falou por cerca de uma hora. Depois, foi levado outra vez ao Helicoide, onde passou por procedimentos administrativos antes de ser liberado.

Na saída, respondendo a jornalistas, disse: “Não posso falar, mas posso continuar fazendo jornalismo. A detenção recorde [mais curta] parece que era 48 horas, e a rompemos. Estou ao lado de Naky, estou bem. É disso que eu preciso.”