FOLHA DE S.PAULO – 25/06/2020
Teté Ribeiro
Era 1986. Joyce dirigia a revista AZ, que tinha sido a Around, da boate Gallery, uma das primeiras customizadas do Brasil, antes mesmo do produto ter ganhado esse nome, quando foi convidada para ser colunista social na Folha.
“Eu estava no final de uma hepatite, decidida a mudar de vida, mas não resisti a ouvir a proposta”, conta ela em seu escritório na Casa Glamurama, de que é dona hoje em dia (a entrevista foi feita antes da quarentena).
Ouviu o chamado, pediu para pensar e depois de um tempo disse que sim, desde que a coluna não tivesse o nome dela. O então editor da Ilustrada, Matinas Suzuki Jr., e o secretário de Redação Caio Túlio Costa que fizeram o convite, reagiram: tem que ter o nome. “Então bem pequenininho, lá embaixo”, pediu ela. “Não, tem que ser grande e em cima”, disse Matinas. Joyce pensou mais um pouco e encarou o desafio.
Mas não sabia datilografar. Escrevia pequenos textos à mão na revista que dirigia. Foi aprender na raça, já na Redação do jornal. “Ficava lá catando milho”, lembra.
Mesmo assim, revolucionou a maneira de fazer coluna social com notícias de personagens de outros meios, não só da sociedade, como empresários, artistas, chefs de cozinha, políticos. “No começo eu não sabia nada de política, então o jornal me ajudava. O Boris (Casoy), que fazia o Painel, me dava uma nota por dia. Acho que era a sobra”, afirma. Depois tomou gosto.
“Não fiz exatamente um projeto de coluna quando eu entrei. Não pensei no jeito que ia escrever, sobre quem, com que equipe. A coluna era como eu era”, diz. E ela era ousada, antenada, tinha humor. E foi introduzindo um jeito coloquial de escrever, com termos que vinham das pessoas com quem convivia. “Tinha lasanha, que era um cara bonitão, saia justa, que depois ficou famoso no Brasil inteiro”, diz. “Eu não escrevia nada antes, então o único jeito que eu sabia me expressar era o jeito que eu pensava”.
E foi sem usar uma palavra difícil que Joyce deu vários furos. De alguns ela lembra até hoje. “Um, principalmente, causou muito burburinho, quando revelei que a Thereza Collor (ex-mulher de Pedro Collor de Mello, irmão de Fernando Collor, presidente do Brasil entre março de 1990 e dezembro de 1992) estava namorando o Paulo Henrique Cardoso (filho do então presidente Fernando Henrique Cardoso, que governou o país entre 1995 e 2002). Foi em 1997, o Fernando Collor ainda era relevante naquela época, e uma Collor e um Cardoso juntos era notícia”, diz.
“Outra inesquecível foi uma briga de soco na casa do (economista e banqueiro) Edemar Cid Ferreira, numa festa ultra high-society”.
Talvez a mais relevante tenha sido a revelação da Operação Uruguai, que tentava livrar Fernando Collor do impeachment com a explicação de que ele tinha conseguido um empréstimo de milhões de dólares no Uruguai, e que era com esse dinheiro que bancava seu estilo de vida.
“Também lembro da nota que eu tinha e não dei, como o namoro da economista Zélia Cardoso de Mello (ministra da Economia do governo Collor) e do então deputado federal Bernardo Cabral (ex-ministro da Justiça). Ele me contou e pediu off. Respeitei, depois me arrependi profundamente”, conta. “Não existe off, se a pessoa me conta alguma coisa e eu sou colunista não tem off. Quer segredo, que vá contar para outra pessoa”, afirma.
Mas o dia a dia da jornalista não era tranquilo. Principalmente o relacionamento com a Secretaria de Redação, o comando do jornal. “Tinha que aprovar a coluna todos os dias, às vezes com os secretários, às vezes com o (diretor de Redação) Otavio (Frias Filho, morto em 2018). Isso era bom, dividia a responsabilidade, mas a relação com a chefia não era fácil”, diz. “Não sei quanta graça o Otavio via em ter uma coluna como a minha. O Matinas entendia melhor, gostava. O Caio Túlio, não”, conta.
Joyce lembra que um que tinha orgulho do trabalho dela era o sr. Frias (Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, morto em 2007), que fazia questão de apresentá-la para quem vinha visitar o jornal. “E nos almoços do nono andar, ele sempre queria saber das fofocas que eu tinha. Era um homem muito especial, fascinante, engraçado”, diz.
Já com o resto da Redação as relações eram menos transparentes. “A Folha era uma festa nos anos 80, todo mundo namorava todo mundo”, lembra, sem relevar se ela mesma namorou alguém. “Mas pairava no ar uma sensação de que eu era uma patricinha, eu sentia isso todos os dias”, diz. E completa: “Uma patricinha que se tornou uma das colunistas mais importantes do Brasil.”