Você pode não ter se dado conta ainda, mas estamos diante da maior encruzilhada de nossas gerações. Não se trata das mundanas opções entre esquerda e direita ou capitalismo x estatismo. O dilema é bem mais profundo e decisivo: ele trata de definirmos se o que vem por aí em termos de inteligência artificial será o maior salto da humanidade desde a invenção da roda ou a nossa danação eterna.
O tema pode não ter chegado às mesas de bares, mas é o principal assunto em fóruns internacionais e entre pensadores, tecnólogos e futuristas. O debate ficou ainda mais aceso a partir do relatório “AI Future Project”, difundido no mês passado. A bateria de previsões sombrias é liderada por Daniel Kokotajlo, um ex-pesquisador da OpenAI que se demitiu por discordar sobre como os ChatGPTs da vida estão avançando — ou seja, sem controle ou preocupação sincera com o que pode ocorrer quando chegarmos ao nível de uma IA capaz de alcançar, e até superar, a inteligência humana.
Ficção científica? Já foi, logo não será mais. A artificial general intelligence (AGI) deve ser realidade dentro dos próximos dois anos, com consequências ainda não compreendidas. Ao se equiparar ao nível humano, a IA ganharia autonomia e poderia supervisionar outras máquinas para acelerar descobertas. No melhor dos mundos, ela encontraria atalhos para descobrir a cura e prevenção de doenças. Se fugir de controle, a máquina começaria a mentir, tomaria decisões próprias, se rebelaria e desencadearia ações bélicas por conta própria ou estimulada por inimigos.
Relendo isso, parece doideira, mas não por acaso o papa Leão XIV, em sua primeira semana de papado, fez um alerta veemente para que a IA seja usada apenas para o bem. Os riscos para a humanidade são concretos, ainda mais porque a corrida ganhou um ritmo próprio entre os titãs da tecnologia, e nem as tentativas de regulação, como na Europa, têm sido capazes de deter ou ao menos redirecionar as locomotivas tecnológicas para os trilhos da racionalidade.
Nós sequer vencemos o abismo digital entre civilizações abastadas e as que ainda morrem de água contaminada, e já estamos diante de algo muito maior. A desinformação e a manipulação de emoções políticas via redes sociais são conto da carochinha perto das ferramentas que começam a ser aplicadas. Recentemente, o Google liberou o Flow, um criador de vídeos hiper-realistas com diálogos. Nada será como antes na indústria de vídeos e, como efeito colateral, na das mentiras e enganações.
E, enquanto a locomotiva da IA segue sem freios, você se pergunta o que será do seu emprego, de seus filhos ou de seus netos. Ninguém sabe. A profissão de hoje pode acabar amanhã, outras que não existem podem surgir neste ano. Seja o que for, é melhor apertar os cintos. A jornada à frente será turbulenta.
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